quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Tomar pingado em Taquarivaí


Me deixa ser feliz!
Cantar Amar Sonhar
Me deixa ir pra Taquarivaí
Não me mande viver em Maracangalha
Pois não quero conhecer a Nália
Em Pasárgada tem um rei que é a lei
Lá não tem a cama que escolhi
Nem o homem que sempre amei
Quero ver gente simples na rua
Uma praça bem pequena
Em verdes se desdobrando
Agora vem o melhor
Vem doçuras de um pingado
Café com leite no copo
Fumegante
Vem quenturas e delícias
De uns salgados estalando
Mas eu só quero mesmo
É esquentar meu peito com um pingado
Mas só se for de Taquarivaí
Taquarivaí é um pequeno e acolhedor município do interior paulista com apenas uma avenida, algumas casinhas brancas e gente muito boa. A inesquecível canção Luar do Sertão de Catulo da Paixão Cearense completa a paisagem bucólica. Que tal pararmos e apurarmos os ouvidos para essa melodia e versos imortais interpretados pelos mestres Gonzagão e Milton Nascimento? Vamos lá, é só enquanto tomamos um pingado...

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O que guardamos no céu da boca


O poético seria dizer que são estrelas no fundo escuro das noites sem fim das galáxias em espirais medonhas engolfadas por buracos negros.
Mentira.
Mera hipótese literária.
Uma língua úmida de palavras desconexas com ilimitados nexos passeia pelos dentes afiados lisos brancos arredondados desafiados a morder a quem aparecer pela frente feito cachorro louco raivoso.
Emudeceu. Guardei a língua para não te dizer palavra.
Não prometo ao mundo minha mudez. Prometer não muda.
Prometer mete a lâmina afiada na criança do poema que não nascerá.
Promete-se nada se cumpre. No céu da boca guarda-se cuspe.
Saliva amarga

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Rosa Passos canta - canta de verdade - 'Curare' de Bororó.

Ouve, gente! Sem pressa! Isso é papa fina...

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Anjos e Ângulos


Um anjo solitário sobrevoa a imensa e urbanizada Berlim. Pára por alguns minutos e repousa sobre um monumento dourado com a forma de anjo alado - ele não possui asas, ainda. Mas esse anjo, em particular, não deseja mais o status celestial, ele quer ser humano, amar, sofrer e se angustiar com a paixão que sente por uma bela, escultural e triste trapezista de circo.

Asas do Desejo (1987) de Wim Winders é um sonho, um poema que alia sensibilidade e técnica no mais alto grau da construção cinematográfica em todos os tempos. Está no topo, dentre os, pelo menos, cem filmes mais importantes do mundo. Mas querem mesmo saber o que me encantou nele? Pois bem, vou revelar-lhes:
- Seus ângulos, seus amplos planos do alto, do céu. É aquele negócio de você entrar no filme junto com o diretor e personagens e suspirar de tristeza quando o filme acaba. Aí, a gente volta a revê-lo e o vemos, mas com um novo olhar, prestando atenção aos mínimos detalhes e diálogos que nos escaparam da primeira vez.
Por exemplo, a atuação do saudoso Peter Falk (o Columbo do seriado que marcou época) é brilhante por ele ser um anjo que convive com os humanos sem que os mesmos possam se dar conta disso. Creio mesmo que na vida real, Falk também detivesse esse toque de carisma angelical. Adorável Peter Falk, sempre te amei!
A filmografia de Wim Wenders é extensa, com seus curtas e longas metragens que nos arrebatam e nos prendem a atenção como se fôssemos, volto a repetir, co-partícipes das suas filmagens.
Aproveitei também o ensejo para inserir três fotos do grande diretor, já que o mesmo mostra-se um fotógrafo espetacular das coisas mais simples da vida e, para quem desconhece, começou sua carreira como desenhista.Não lhes peço que gostem do que aprecio, porém se sobrar um tempinho,tentem se envolver de corpo e alma na estética transcendental desse mago do cinema.
Angie com os Rolling Stones faz o fundo musical. Wenders sempre curtiu um rock balada bem maneiro.
Então tá! Por hoje, é só!Vamos dar asas à nossa imaginação...

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Vocação é voz interior - Vítor Binot

Há pessoas que ouvem uma voz dentro de si e, simplesmente, a seguem. Com o jovem Vítor foi assim. Filho de uma radialista famosa, Yara Salles, ele, simplesmente, partiu num avião rumo à Índia onde seria iniciado como monge budista. Naquela época, a sociedade ainda não aceitava bem as religiões orientais e criou-se todo um debate em torno do assunto que perdurou por meses.
O tempo passou, a TV exibiu uma entrevista com um homem na faixa dos seus trinta anos numa noite inesquecível, finais dos anos setenta. Rosto tranquilo e sorridente, Vítor Binot respondeu a todas as perguntas enfatizando da sua emoção quando entrou pela primeira vez no templo onde passaria muitos anos na convivência com seus mestres e amigos. As cores do local e os sons dos mantras budistas lhe proporcionavam momentos raros de elevação espiritual o que lhe serviu de base para o seu longo aprendizado religioso e pessoal. Aprendizado esse que foi repassado na sua academia familiar àqueles que o procuravam quando retornou ao Brasil.
Vítor não ficou muito tempo entre nós, faleceu de leucemia pouco depois, mas ficou imortalizado na alma de quem, de uma certa forma, compreendeu sua simplicidade de ser e, principalmente, a sua maneira de estar no mundo sem se apegar a ele como naquele ritual milenar em que monges principiantes pintam uma mandala com areias coloridas para, em seguida, desmanchá-la com um simples sopro.
A vida humana é apenas um sopro diante da eternidade, seria essa a mensagem?
A cantora Joyce, uma de suas discípulas, com muita inspiração, sintetizou magnificamente o que Monsieur Binot nos legou em uma das suas canções.Vamos ouvi-la?

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Daniel, o Brasileirão

Um bonde lotado passa pela avenida. A tarde já vem caindo e o céu da cidade se desabotoa em tons múltiplos de azuis e rosa pálido.

Sapatos mocassins e jeans claro, vê-se um senhor grisalho, belo e vigoroso na sua maturidade. Ele entra num café de portal de madeira maciça, senta-se à mesa forrada de toalha quadriculada e, em voz muito baixa, pede ao garçom uma caneca de vinho verde acompanhada de sardinhas fritas ao azeite. Estamos em Lisboa.

O lugarejo tem apenas uma estrada sem fim que percorre a caatinga seca, mas que revela um umbuzeiro florido sob o sol escaldante, enquanto o gado faminto e magro devora um pé espinhoso, mas suculento, de mandacaru.Ouvindo um repentista velho e cego, Daniel oferece sua mão a uma cabocla de negras tranças. Ambos ouvem Pavão Mysterioso, o cordel mais cantado do sertão, cuja origem remonta à mais antiga tradição oral do povo brasileiro.

Lá, onde o fado nasceu sob xale negro e triste; aqui, onde o sanfoneiro anima a todos com forrós, emboladas e cocos, esse singular Poeta, participa e até canta, juntando sua voz a todas as vozes dos trabalhadores do sertão.Brasileirão de coração aberto em paz, segue Daniel Costa, reconstruindo essa ponte entre duas nações, Brasil e Portugal.

Ednardo, compositor cearense, uniu-se no passado ao Fagner, Belchior e Amelinha para reacender a cultura popular nordestina. Daí, nasceram "muitos filhos", entre eles, o resssurgimento da literatura de cordel onde Pavão Mysterioso tem seu ápice. O clipe surpreende por sua universalidade e estética puramente nordestinas, vamos curtir?
Beijos, amigo Daniel!
Um cheiro pr'ocês...

quinta-feira, 14 de julho de 2011

O Ventríloquo que Emudeceu

PARA CRIANÇAS E ADULTOS
Conto inspirado na imortal obra do italiano Carlo Collodi, Pinóquio:
O espelho do camarim lhe revelava o que ele próprio recusava-se a ver, a sua decadência. Uma calvície acentuada, orelhas pontiagudas, olhos opacos, um corpo magro em pele e osso, tudo isso e mais um temperamento difícil o tornavam asqueroso nas suas frustradas tentativas de contatos com as mulheres.
Tal qual Geppeto da fábula, esse arremedo humano, vendo-se envolto em amarguras e desespero, decidiu-se por dar corpo e vida ao seu Pinóquio. Assim brotava da madeira inanimada o alter ego, ou seja, o que Jonas sempre desejara ser, mas não era. Até o nome não lhe pertencia e o povo chamava-o de Jonas por seu passado dentro de navios de pesca, onde sacrificara golfinhos e animais marinhos em sanguinolentas pescarias predatórias, impiedosas. Diziam que, ao contrário do personagem bíblico que renascera do ventre de uma baleia, poderia ter sido digerido pela mesma que falta não faria à humanidade.
Habilidoso entalhador, o velho rasgou com a faca a casca e a carne de uma das mais belas árvores de um parque público e a transformou num boneco caprichoso e sedutor.

O sucesso chegou e os espetáculos se sucediam. Apresentavam-se para o público infantil nos circos, e as crianças, entre pipocas e algodões doces, riam-se sem parar dos trejeitos e anedotas do pequenino ser envernizado.
Daí, para o teatro de marionetes, foi uma simples questão de tempo. O público feminino ficava histérico e Jonas, por dentro, exultava. Sua boca nunca se abria, pois tinha que simular a voz de sua criatura, seu novo som, um 'new sound'- como gostava de denominá-lo em inglês.
As almas de ambos uniram-se, e passaram a afundar mais e mais na escuridão e no torvelinho do egocentrismo e malícia. Jonas bebia além dos limites e até seu brinquedinho trazia uma garrafa na mão. Tal pai, tal filho. Grosserias e palavrões começaram a repercutir mal em seus shows e os contratos escasseavam.
Simultaneamante, não sabemos se foi um toque do destino (quem poderá sabê-lo?), na sua última apresentação, o carismático 'new sound' desfez-se repentinamente em pó. Os cupins o corroeram por dentro e corroído de muita tristeza, seu dono foi definhando, definhando. Voltou a ser um solitário. Emudeceu para sempre.
Essa é uma dura lição para aqueles que confundem criador e criatura, somos apenas o que somos, sem máscaras de lobo ou ovelha, seres humanos imperfeitos em busca de algo que nos torne menos embrutecidos e mais humanizados em relação ao nosso próximo.
Indico-lhes um seriado interessante com uma temática mágica e deliciosa, O Mestre dos Brinquedos, vale a pena dar uma olhadela.Imperdível!

Mas o espetáculo não pode parar...
E o palhaço o que é?
É ladrão de mulher!
Recordar é viver!
Vamos curtir juntos João e Maria com a Eterna Musa da Bossa-Nova, Nara Leão em dueto com Chico Buarque:
"Agora eu era o rei
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy era você
Além das outras três..."
Beijos, amigos! Até breve! Isto é, se Papai-do-Céu assim o permitir, lógico!!!

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Versos em D de Diva

César Costa Filho, o nosso Cesinha, compositor e intérprete mais sutil e discreto da MPB, totalmente avesso às luzes dos refletores - afastou-se cedo e por completo da vida artística - compôs e cantou, entre muitos sucessos da década de 70, uma música bastante original e de uma ternura ímpar. Diva seria uma variante da palavra vida com algumas aliterações no conteúdo do poema? Bem, problemas para os gramáticos de plantão. A Poesia de Diva parece-me levemente erotizada, mas exalta a multiplicidade da psicologia feminina e, por consequência, da própria vida.O romantismo, essa idealização da mulher amada, não me parece tão marcante. Todos os seus versos incluem a letra "d". Observem e vejam que estrutura poética e melódica esse artista e estudioso(cursou a faculdade de Letras) legou para a posteridade. Lindo! Genial! Inspiração em estado puro.
DIVA

Diva
Trouxeste a vida e a vida te levou
Deixando em vão um devaneio

Triste dia
Chovia e Diva te dividias
Devagar
Mulher e nuvem
Diva
Te devo a vida e a vida deve a mim
A tua voz que me implorava amor
Eu ouvia
Te dava e Diva
Não duvidavas que eras dívida e dádiva
Diva
A vida é dádiva, é divída, é devaneio
A vida me deve Diva...ôoooooo
Quero Diva de novo num dia de chuva
Diva
Sei que a vida é dividir, duvidar
Diva
Divina nuvem dividida
Ô Diva
Divina Nuvem dividida
Diva



sexta-feira, 17 de junho de 2011

Liz e Burton, amor gostoso e rasgado


Brigas, tapas e beijos. Reconciliações e anel de diamante no dedinho dela. Casaram-se e divorciaram-se por duas vezes.Ele bebia até o fígado dizer chega e ela comia até o estômago explodir. Tudo em suas vidas foi um exagero, mas pergunto-lhes: quem já amou certinho? Não mintam para si mesmos. Sabemos que jamais haverá sensatez onde flameja o fogo de eros.
Richard Burton foi o maior ator shakespeariano de todos os tempos e seu desempenho nos filmes era, simplesmente, irretocável, perfeito. Homem simples e afetuoso até com desconhecidos. Costumava rodar de táxi por New York e parava o carro para pessoas em apuros no trânsito. Foi numa dessas que deu carona a um jornalista brasileiro, ficando alucinado quando soube da sua nacionalidade:
"- Eu vou ao Brasil só para rever o meu amigo Fonseca!" Dizia ao carona brasileiro.
"- Por acaso, você conhece o Fonseca?"
Não, ninguém conhecia o tal Fonseca, só ele, embriagado que estava pela saudade que sentia do velho amigo.
Elizabeth Taylor, a Cleópatra mais sedutora do cinema e par romântico de James Dean em Assim Caminha a Humanidade, não nos deixava descolar os olhos da tela quando aparecia em close. Uma deusa inglesa na América.

Perguntada se sentia vergonha das supostas surras que levava de Burton, respondia com fina ironia na voz:"- Meu caro, eu acho que você já deveria saber que pancada de amor não dói."
Um dia desses, paixão acesa em seus olhos de matizes violáceos, Liz se uniu definitivamente ao seu Marco Antonio (Burton por ela se apaixonou ao fazer esse papel) e, daqui da terra, os vejo fazendo amor em pleno set cinematográfico do paraíso onde residem os amantes imortais.
Não importa, amor gostoso e rasgado não tem hora nem lugar para acontecer.
A música para acompanhar esse eterno idílio?
Tony Bennett, Stranger in Paradise.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Ao meu Cunhado

Pássaro Livre

Atravessa o céu


Segue tranquilo no seu voar solitário

Choca-se com o infinito

Beijando o azul do azul do azul...azul

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Férias Estradas e Paisagens

- Vá de avião! É mais rápido.
Discordei prontamente:
- Prefiro a magia da janela do ônibus, pois através dela posso ver essas estradas se descerrando na sua real plenitude. Vejo essa terra forte, fértil, viril e vermelha de onde nascem árvores centenárias, matos e lugarejos humildes onde habita o nosso povo. Esse, sim, é o verdadeiro Brasil que eu gosto de sentir bem de pertinho, sem falso patriotismo, pode crer.Portanto, nada de rapidez, ao contrário, prefiro ser lenta, lentíssima ao me reencontrar com cada pedacinho desse meu torrão nacional. A cidade fotografada chama-se Itapeva, fica situada no sudoeste paulista, um pedacinho do paraíso e o SUS de lá funciona. Mas chega de blá, blá, blá e vamos ver as fotos? Bye Bye Brasil com Chico Buarque, vale a pena ouvir de novo. Vamos lá, grande Chico?