quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Dinah, o rádio e a toalha de crochê

Cronista do cotidiano, sua voz pausada expandia-se das válvulas do rádio, insinuava-se pelos interstícios da toalha branca de crochê, percorria paredes, teto e espraiava-se nos tacos de madeira encerados do piso.
Dinah Silveira de Queiroz falava desde o homem simples na fila do ônibus até a babá namorando no parque enquanto balançava o carrinho de bebê. Porém, num dia qualquer do passado, colocaram um aparelho de tela cinzenta no lugar do velho e amigo rádio. Dali, surgiu a imagem de uma senhora elegante, de cabelos curtos, vestida de negro e uma bolsa idem sobre os joelhos. A escritora começava a ser entrevistada. Seu semblante era belo, mas havia uma certa estranheza naquele rosto impassível, dizem que Dinah tinha "uma beleza semita". No rádio era uma, na TV era contida, não demonstrava nenhum traço de emoção. Apenas seus lábios finos moviam-se. Mesmo assim, sua mensagem era interessante e inspirada, pois discorria com intimidade sobre seus personagens e, em dado momento, deixou escapar que os mesmos a visitavam em sonhos com cenário  todo colorido e detalhado. Nada demais para uma das pioneiras da ficção científica no Brasil, sem contar suas incursões no gênero realismo fantástico que também a fascinava. Hoje em dia, poderíamos especular se ela sería médium ou paranormal. Aliás, particularmente, acredito que todo artista, poeta e escritor o seja, sem sombra de dúvida. O próprio Fernando Pessoa cansou de falar nessas coisas nos seus magníficos poemas. Bem, mas isso é uma discussão à parte.
Inesquecível criadora, pelo menos, dois dos seus romances foram fenômenos de vendas e   adaptações na TV e cinema: Floradas na Serra e A Muralha.
E pensar que essa notável dama da nossa literatura já fez cem anos em 2011, mesmo já tendo falecido em 1982, aos setenta e um anos de idade!Quem se lembra? Ou melhor, quem procura relembrar a luta dessa mulher e intelectual de escol para nos legar essa obra imensamente diversificada?
Quanta falta fazes, Dinah! Saudade do rádio, do crochê, saudade também de mim.