sábado, 29 de setembro de 2012

A casa dos outros é melhor!

Quem sabe, aquelas reminiscências da infância, de brincar e curtir a casa dos coleguinhas, tenham uma razão mais profunda de ser?
Olhemos lá para trás, no alvorecer da humanidade, tribos nômades, as caravanas da rota da seda, e até os nossos indígenas, todos em constante mudança, todos sem fincar pé, sem criar limo na pedra.
Será que eles é que eram os atrasados, e nós, apenas nós, prisioneiros em condomínios fechados, os evoluídos?
O arquiteto, humanista e grande pensador, Sérgio Bernardes, com seus tantos milhares de projetos inteligentissimos, fez-me parar pra pensar por muitos anos em apenas um deles. Sua proposta era simples e (ainda) revolucionária: a  troca de residências. Se você precisa se mudar de casa e alguém em outro lugar do planeta também, troquem de casa. Você vem pra minha, eu vou pra sua. Não é fácil? Você pensa assim? Não pensa?
Veja, a questão aqui não é só exterior e materialista, tudo pode ser e deveria ser resumido numa postura de confiança e respeito pelo outro. Não basta ir no cartório e firmar um título de propriedade ou um contrato qualquer, mudemos por dentro e mudaremos por fora. Sendo assim, todas as outras coisas se resolverão a contento. Isso, a meu ver, é que é ser moderno, o resto é enganação e individualismo no mais alto grau. Aliás, o nosso individualismo e egoísmo estão nos levando por caminhos cada vez mais desastrosos.
A palavra moderno, trouxe-me à mente a lembrança do gênio criativo de Chaplin que, ao levar para o cinema Tempos Modernos, tornou-se o pioneiro nessa idéia ao colocar um casal apaixonado, mas pobre, dentro de um shopping de luxo, onde ambos por uma noite apenas, absorveram dali todo o proveito de uma vida confortável e digna que jamais teriam pela frente. Viva o eterno Carlitos!
El Habitante Incierto do jovem diretor, Guillem Morales, e Casa Vazia do magistral coreano, Ki-duk Kim, chegaram agora para ampliar e dar força, pelo menos na ficção, de que o impossível pode e deve ser tentado.
Afinal, meus amigos, a única certeza que temos nessa vida é da impermanência das coisas.
"Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha nada..." Só para não deixar de citar nosso poetinha, Vinícius de Moraes em Vinícius para Crianças, o álbum de músicas infantis mais bonito que já conheci.
E agora, posso ir na sua casa?

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Penélope das ruas

Ônibus lotado, setembro chegou, o calor dos corpos, suores, desodorantes no ar, cheiro de gente. Da janela, viam-se pequenos jardins onde minúsculas flores despertavam nossos sentidos com cores primaveris. Breve namoro com a natureza no caos da cidade veloz, feroz.
Vestido de tricô verde-claro, artesanal, ponto a ponto, ela trazia em suas robustas e calosas mãos, agulhas de tricô que se movimentavam magicamente, hipnoticamente céleres.
Os atropelos do veículo não alteravam o seu ânimo, tranquila estava, sentou-se ao meu lado.
Chegou o ponto final e desceu. Ainda a vejo parada na rua, Um pouco de verde na dureza cinzenta do asfalto, sol sobre sua cabeça de fios prateados. Novelo vivo de lã humana, tecelã dos nadas.
Penélope das ruas, anônima e solitária. Perdeu-se do meu olhar.